quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Nos deixem caminhar em paz pelas ruas.



Esse vídeo é uma adaptação do curta argentino Por la Calle, uma tragicomédia que traz à tona a questão da violência verbal e sexual contra mulheres nas ruas. A Campanha, dirigida por Hugo Meyer, solta a questão: "Qual a pior coisa que você já ouviu nas ruas?" E, ao inverter os papéis, propõe que os homens se coloquem no lugar das mulheres e as deixem em paz.


O trajeto percorrido pelo vídeo é o mais be-a-bá de todos, de casa ao ponto de ônibus. Inicialmente ele, a vítima, fica surpreso e lisonjeado com os “elogios”, mas, no decorrer da caminhada as cantadas se tornam xingamentos, constrangimentos, ou, assédio verbal. E é neste ponto que repousam duas importantes questões: A linha tênue entre um elogio e um assédio verbal/sexual, que é comumente ignorada; E, a latente desigualdade de gênero como causa magna dessa violência naturalizada.

Violência? Que exagero! - alguns dirão, ou melhor, muitos dirão. Não tenho medo de afirmar (com toda a certeza) que as pessoas que acharão isto um exagero são majoritariamente homens. São pessoas que nunca tiveram que lidar com tais situações e ainda (pasmem) ousam dizer algo como: Toda mulher adora uma cantada de rua. Claro, eis o fato:

Mulheres, em geral, para se sentirem bem, desejadas e lindas precisam saber às 7h da manhã, no meio de uma rua qualquer e através de desconhecidos grotescos e assustadores, o quão gostosas são e, ainda, quais as peripécias sexuais que eles poderiam realizar com seus corpos, independentemente de consentimento.[/ironia]

Nós, mulheres, passamos por isso corriqueiramente e o ato não depende do quanto nos aproximamos do padrão de beleza vigente, eu diria que isto determina apenas a frequencia. Para ser assediada basta ser "fêmea". E, ao contrário do fato acima ser senso quase-comum,  na grande maioria dos casos, estas selvagerias não “aumentam a autoestima”. 

Imaginá esto todos los días desde que tenés 12 años.
Imaginá esto todos los días!
Sem ao menos desejar ouvir.
Sem ao menos dar a liberdade ao sujeito.
Sem ao menos poder revidar ou fazer calar.

Entende-se por assédio sexual qualquer tipo de coerção de caráter sexual praticada (geralmente) por uma pessoa em posição hierárquica superior em relação a um subordinado. “Lei nº. 10.224/01 - Assédio sexual: Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”. Caracteriza-se por alguma ameaça, insinuação de ameaça ou hostilidade contra o subordinado.

Tendo isso em vista, o assédio sexual e/ou verbal é abuso de poder. Mas, não acredito que essa violência esteja restrita apenas ao ambiente de trabalho, como explicitado na Lei. A desigualdade entre homens e mulheres não passa de uma grande, socialmente construída e perpetuada relação de poder, na qual as mulheres são as subordinadas.

Andarilhando pela blogosfera feminista esbarrei numa situação bacana. Um homem perguntava para um blog se ao dizer “‘gostosa’, ‘te como toda’ e etc” (sic) estaria ele sendo grosseiro, vulgar, ou, cometendo um assédio sexual. Ele ainda citou a restrição do assédio apenas ao ambiente de trabalho e a foto amplamente divulgada nas redes socias ultimamente - Assédio sexual não é elogio. Em resposta, a blogueira expressou o meu sentimento, e certamente de muitas outras mulheres, ao deixar claro que quando tais frases vêm de homens desconhecidos, a única reação é sentir-se ameaçada. Agora, esse tipo de fala em um contexto de relação amistosa ou amorosa são outros quinhentos, meu bem.

Exemplo de Ação Direta contra o assédio verbal.

Outra obra bacana, ainda que expressando uma triste realidade, é o Femme de la Rue, documentário de Sofie Peeters que, com uma câmera escondida, registrou o assédio sexual e os insultos que sofria enquanto caminhava pelas ruas de Bruxelas. Na França e na Bélgica o ‘street harassment’ (assédio de rua) já é considerado ilegal, mas temo eu que a pena pecuniária não é muito eficaz contra o machismo impregnado em nossa sociedade. Por fim, da Inglaterra surgiu a organização Stop Sreet Harrassment que, na minha opinião, é o mais consistente movimento de resistência contra o assédio de rua - Page no Facebook.

Street harassment é qualquer ação ou comentário entre estranhos em locais públicos, que é desrespeitoso, indesejável, ameaçador e/ou assédio motivados por relações de gênero.

Pare, respeite, nos deixem caminhar em paz. Esperamos e lutamos pelo dia em que ao sair na rua nossos ouvidos sejam recepcionados com muitos bom dia(s).



2 comentários:

  1. Adorei o texto Andressa e também o curta. Sentir na pele é a única maneira de alguém entender quando esta ofendendo alguém, seja por machismo, racismo ou qualquer outro ismo que nos cause opressão.

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