Vamos
falar de um assunto cabeludo e que por vezes é proibido nos papos de amigxs, um
tema que causa riso ou repulsa, que é sussurrado e escondido. Vamos falar das
vaginas. Estas criaturas que historicamente foram abafadas, reduzidas a
recipientes. Se você tem uma, aproxime-se, há muito a descobrir. E se você não
tem, venha também, presenciar o espetáculo que é a vagina.
Primeiro
de tudo, já prestou atenção como é impronunciável a palavra va gi na? Isso faz
parte do modo como a sexualidade feminina foi e é encarada. Há tantos outros
nomes mais "suaves", de fato há apelidos para o pênis também, mas
quando se trata de vagina, é agressivo aos ouvidos, irritante e muito, muito
feio. Pouca gente consegue falar vagina com naturalidade e sem tanto medo das
reações; o que não faz muito sentido, afinal, ela faz parte do corpo feminino,
como os olhos (tão homenageados e poetizados), a boca e os pés.
Sobre
isso temos um trecho bem legal do livro "Os monólogos da Vagina, da Eve
Ensler:
"Vamos começar simplesmente com a
palavra "vagina", No mínimo, soa como uma infecção,
talvez um instrumento médico. — Rápido, enfermeira, me dá a
vagina!
"Vagina." "Vagina." Não importa quantas vezes você
diga, nunca soa como uma palavra que você quer dizer. Uma palavra
totalmente ridícula, completamente assexuada. Se você a usar durante o ato sexual,
tentando ser politicamente correta — "Meu bem, dá pra
massagear a minha vagina?" —, você acabará com o clima erótico na
hora.
Estou preocupada com vaginas. Preocupada com os nomes com as quais as
chamamos e com os nomes com os quais não as chamamos."
E
para que você, carx leitorx, desmistifique essa palavra tão antiga e
necessária, indico que leia o
livro todo, baseado nas mais de 200 entrevistas que a autora fez sobre
as mulheres e suas vaginas. Virou peça e sucesso, até hoje o espetáculo é
montado em diversos países. Dizem que é comédia, mas a leitura não me foi nada
engraçada, foi comovente. As histórias dessas mulheres e a busca por suas
vaginas tem todo o meu respeito e admiração. Aqui,
o link para download. E aqui, a versão para
televisão da peça, produzida pela HBO.
Por
enquanto ficamos no campo semântico, a palavra vagina como tabu . Agora lhe
pergunto, pra que serve sua vagina? Essa, que pulsa no seu corpo, que guia suas
emoções e irradia energia, essa que faz parte de você, que é você. Segundo a
wikipédia, a função dela é "receber o pênis no coito e
dar saída ao feto no momento do parto, assim como expulsar o conteúdo
menstrual" e nada mais. Claro que a wikipédia não é a fonte mais
segura e coerente do mundo, mas essa definição de para que serve a vagina é a
verdade absoluta para muitas, muitas pessoas.
Isso
de encarará-la apenas como porta de entrada do pênis e porta de saída do
bebê e da menstruação é um indicativo de toda a história de opressão das vaginas.
E, infelizmente, isso está extremamente ligado à recorrente “adoração” do pênis,
o forte, fálico e fidalgo órgão masculino. Pelo menos por aqui, se o garoto
toca suas partes íntimas, repreendem, mas “é compreensível, homem não se
segura, né”. Já as meninas são desconjuradas, desconstruídas e ouvem um “coisa
feia! Menina decente não faz essas coisas!”. Cansei de ver isso, e eram só
crianças, descobrindo o próprio corpo, que tiveram o azar de achar interessante
mais um pedaço de si, pedaço esse que a sociedade vê como impuro, errado e
indecente, pecaminoso.
Vaginas servem por exemplo, para inspirar cupcakes |
Além
dos problemas com a palavra, com a vagina e seu lugar, há uma triste maneira de
vê-la. Sobre isso temos um texto muito interessante da Eliane Brum, aqui. Ela conta sobre o quadro "A origem do Mundo" de Gustave Coubert, e o horror que causou em sua empregada, faz perguntas interessantíssimas sobre as vaginas e o asco que normalmente provocam.
Esse é o quadro:
Argh!
Tanta gente reage assim, acho que quase todo mundo. E por quê? O que há nas
vaginas para se enquadrarem apenas no “feio, nojento” e etc? Para refletir um pouco sobre isso, mais um trecho de "Os monólogos da vagina":
“— Se sua vagina se vestisse, o que
usaria?
Uma jaqueta de couro. Meias de seda. Mink.
Um boá cor-de-rosa. Um smoking masculino. Jeans. Alguma coisa bem justa. Esmeraldas.
Um vestido de baile. Lantejoulas. Somente Armani. Um tutu de balé. Calcinhas
pretas transparentes. Pijama de veludo púrpura. Um vestido de baile de tafetá. Alguma
coisa que pudesse ser lavada na máquina. Máscara de baile à fantasia. Angorá. Gravata-borboleta
vermelha. Arminho e pérolas. Um enorme chapéu cheio de flores. Um chapéu de
leopardo. Um quimono de seda.Uma boina. Calças de cooper. Uma tatuagem. Um
dispositivo elétrico que desse choques para manter estranhos a distância. Saltos
altos. Rendas e botas de combate. Plumas púrpuras, brotos e conchas. Algodão. Um
babador. Um biquíni. Um impermeável.”
Achei tão bela essa parte. Nós mulheres precisamos nos fazer perguntas desse tipo, o que sua vagina vestiria? Há tanto sobre nossas vaginas que não sabemos. Elas são a expressão maior de como somos podadas, limitadas, ensinadas a não ser o que somos. Depois do livro e pesquisas sobre, começo a achar muito bonito esse quadro aqui:
A exposição "The great wall of vagina" (O grande muro da vagina) foi criada pelo britânico Jamie McCartney. Aqui, o site. São cerca de 400 vaginas modeladas em gesso, de todas as formas e tamanhos que provocam. Desnecessário? Sem sentido? Acho que não, hein.. Se te fez fazer uma careta, tá cumprindo seu devido papel.
E por último, mas não menos importante, uma outra indicação. O livro "A história da V", de Caherine Blackledge, ainda não li, mas encontrei muitas resenhas positivas. Aqui uma ficha técnica.
No mais, continuemos a falar a palavra vagina, a nos perguntar por que ela vem sendo relegada à função de receptáculo e por que causa tamanho horror; porque uma coisa é certa, as vaginas continuarão a existir e a fazer existir.
* e só uma coisa, quando fui colocar as tags desse post, percebi que ainda não havíamos falado sobre vaginas. Por que será, né?!
* e só uma coisa, quando fui colocar as tags desse post, percebi que ainda não havíamos falado sobre vaginas. Por que será, né?!
Muy bueno, muy bueno. xD
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