segunda-feira, 26 de março de 2012

A Mulher do Resultado Positivo

Via-se de longe aquela mulher muito branca com pouco mais de um metro e sessenta de mochila de pano e sapatilha preta. Tinha rosto redondo, traços finos e seu cabelo preto e curto levemente bagunçado. Do ônibus que acabara de descer, ouvia-se o som das grandes rodas nos paralelepípedos da rua e via-se apenas o rastro de fumaça preta deixado há segundos no ambiente.

Andava desnorteada em direção ao hotel que havia reservado. Em seu olhar, percebia-se claramente a inquietação típica de quem acabara de receber o resultado que tinha – e que estava em sua bolsa verde, dentro de um livro de poesias. Sentia o gelado de seus braços e pés, onde sentia também os vãos e calombos do chão, que faziam massagem em seu calcanhar. Enquanto andava, ouvia o ir e vir dos carros em alta velocidade sob os paralelepípedos, assim como o quádruplo som do galopar dos cavalos. Esses barulhos a acalmavam e a faziam esquecer, por uns instantes, da folha de papel dentro do livro em sua bolsa. Queria voltar dois meses no tempo e evitar que aquele exame desse positivo. Agora era tarde.

Continuava andando, dessa vez não mais nos paralelepípedos da rua, mas na calçada com pedras maiores e menos geladas. Andar fazia barulho áspero: o atrito das pedras com as sapatilhas moleca sujas de terra. Enquanto olhava as árvores e vagava o pensamento, pegava com a mão direita folhas de erva daninha nos muros das residências, sentia poeira nelas repousada e as quebrava com os dedos, o que expelia som crocante e curiosamente prazeroso.

Entrando no hotel, a pequena mulher de resultado positivo se encolheu de frio. Com teto e paredes altas, todo e qualquer movimento ecoava em som mais alto, o que fazia com que percebesse todo movimento de seu casaco de linho ao cruzar os braços para se esquentar. Cada passo em direção à recepção era multiplicado, o que dava a impressão de sala cheia, quando só tinha ela e a recepcionista. Pegou sua chave e subiu as escadas de madeira antiga que rangiam em som quase harmônico em direção ao seu quarto.

Ele tinha duas camas já com cobertores de lã em cima, teto baixo, aproximadamente dois metros e trinta, piso de pedra sabão e televisão em apoio na parede - era uma suíte. Foi em direção ao banho: era uma das coisas que a relaxava. Ao tirar os sapatos, sentiu o piso exageradamente gelado em seus pés e apoiou-se na parede, que também estava muito fria, para tirar as calças. Ficando completamente nua, ligou com rapidez o chuveiro quente, que demorou cerca de dois segundos para esquentar por completo. Foi só sentir o calor molhado em suas costas que ela ficou bem. Fechou os olhos.

Sentia apenas a água no corpo e ouvia seu som, tanto escorrendo por sua pele, quanto indo direto ao chão do boxe ou respingando na porta de vidro. O resultado do exame lhe vinha a cabeça a todo tempo, e ela sabia que tinha que tomar uma decisão rápida sobre sua e outra vida o quanto antes. Pensava nos seus próximos sete meses, aflita. Passeava com a palma da mão por seu corpo inteiro, o acariciando; e foi nesse exato momento que percebeu algo dentro de si. Sentiu nela o que havia imaginado apenas quando criança. Deu-se conta da vida. Ficou paralisada de olhos fechados durante exatamente nove segundos, ouvindo o som do chuveiro, sentindo o gelado de seus pés e quente de suas costas e pensando naquela sensação. No nono segundo fechou a torneira, saiu do banheiro, botou seu pijama, se encolheu no cobertor, e sorriu. Ela teria aquela criança. Caiu no sono.

2 comentários:

  1. Lembro desse texto! Laboratório do escritor?

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  2. Na verdade foi aquele conto de Petrópolis que usei pro Laboratório. Adoro uma reciclagem! hahaha

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