quarta-feira, 16 de maio de 2012

Profissionais ou putas?

  
  Você vê de madrugada pelas ruas, você até conhece algumas. Mas afinal, o que você pensa das mulheres da vida? 

   Mulheres como Maria Nilce Evaristo dos Santos, 56 anos, mais de 25 na batalha, que tem uma bela carteira de clientes jovens, sem contar com os velhos e fiéis amigos. Essa clientela variada foi conquistada, segundo ela, com paciência, carinho e muita criatividade na cama. "As meninas de hoje não têm paciência com os clientes e acabam perdendo boas oportunidades", conta Maria a Carlos Nobre em entrevista à revista Beijo da Rua. Maria também trabalha como agente multiplicadora do Davida. Com quatro filhos e dez netos, Maria é também uma vovó carinhosa e aplicada, que leva e traz os netinhos para o colégio.

   Maria tem responsabilidades, tem família, tem trabalho. Sim, trabalho. Eis que a pergunta inicial do texto não faz a menor diferença. Pouco importa o que você pensa sobre a prostituição, mas é fato que a atividade, além de legal, movimenta a economia desde os remotos tempos em que está presente nas mais diversas sociedades. A luta agora é pela sua profissionalização. 

   Insere-se ainda na discussão questões de direitos humanos, sob o viés da dignidade. Os homens e mulheres que trabalham com o sexo são muitas e injustas vezes criminalizados, e estão rotineiramente vulneráveis durante sua atividade, sem por isso receber qualquer assistência do Estado por não ser uma profissão regulamentada. 

  A profissionalização da prostituição garantiria direitos comuns a qualquer outro trabalhador regular, tornando jurídico o que a sociedade pode começar a pensar como moral. Para a satisfação dos que lutam pela causa, envolvidos nela ou não, percebe-se avanços no âmbito jurídico, pela sentença que legitimou a prostituição, comentada* por Roberto Chateubriand: 



  “Vemos que parte do Judiciário consegue acompanhar a evolução da sociedade e oferecer respostas condignas com o movimento dinâmico que a caracteriza, bem mais do que Legislativo. Se pensarmos que o PL 98/2003 encontra-se arquivado depois de anos de tramitação, temos na sentença deste juiz uma decisão que rompe com o legalismo tacanho e homenageia a liberdade, inclusive a sexual, já prevista pela nossa Constituição, ainda que a lei penal insista em punir uma prática que há muito deixou de ser condenada pelo conjunto da população. 
   Mais do que dizer que manter casa de prostituição não é crime, o juiz André Luiz Nicolitt decreta a legitimidade da prostituição por reconhecer, neste ofício, uma profissão exercida por pessoas livres, autônomas e, sobretudo, iguais a qualquer outro tipo de trabalhador, cuja exploração, se houver, diz muito mais acerca das condições de trabalho preditas pelo sistema capitalista do que pela prostituição em si.     
  Mesmo que esta sentença venha ser reformada em razão de uma apelação moralista revestida de interpretação positivista do Direito, enxerga-se nela uma esperança de transformação efetiva, pois revela-se como um ato concreto de possibilidade de leitura do Código Penal à luz da Constituição e dos Direitos Humanos. No meio da onda conservadora que assola o mundo contemporâneo, vemos que nem tudo está perdido”.



*comentário retirado do site Beijo da Rua, do jornal homônimo fundado por Gabriela S. Leite em 1988 e editado por Flávio Luiz.


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