quarta-feira, 25 de julho de 2012

Mulheres da luta... virtual.

    Em seu último texto, Era uma vez?, Ananda Marques falou das personagens da Disney que marcaram a infância dos anos 90, e, como tudo que marca uma infância, moldaram nossa visão de mundo. Muito mais que nostalgia, o texto nos faz pensar em como a mudança dos padrões do que consumimos espelha nosso comportamento. Ainda no universo lúdico, e relembrando a infância dessa mesma geração, nota-se como os games têm imensa participação nessa formação. As histórias dos jogos até hoje fazem parte do nosso imaginário, tanto quanto os contos de fadas. 
    Muitos eram considerados violentos, inapropriados, especialmente para as meninas. Mas ainda assim, elas teimavam em dominar o controle do vídeo game. E quanto às meninas que estiveram por dentro da tela, que história elas legaram? 
    Vivemos uma geração em que brincar de boneca já não tinha tanta graça, o “felizes para sempre” era “zerar”, e não bastava destruir a bruxa ou matar o dragão; tinha que passar de fase, enfrentar o chefão... o mais próximo de conto de fadas era a Princesa Peach, donzela (há controvérsias) que esperava ser salva pelo herói num cavalo branco dinossauro. 
    O mundo mudou, e agora as meninas queriam lutar, o que nesse caso tratava-se de escolher Chun-Li no Street Fighter II. A história da chinesa que buscava vingar a morte do pai foi um marco da presença feminina nos jogos de luta, e abriu portas para a criação de novas mulheres lutadoras. Nesse contexto, Mortal Kombat trouxe os leques de ferro de Kitana, sua rival Mileena, e a também mascarada Jade: todas com muita coragem e pouca roupa, dando início a era das lutadoras fortes, ágeis, habilidosas, e muito sensuais. Em destaque no grupo, claro, a lendária tenente Sonya Blade. 
    Da luta corporal para as armas de fogo, elas não perderam a graça, e ganharam novas habilidades para enfrentar inimigos ainda mais poderosos que o oponente de combate, e isso incluía mutantes e armas biológicas. Como não lembrar de Jill Valentine e Claire Redfield, belas e sagazes na batalha contra a Umbrella , Inc. Ou até mesmo quando as próprias heroínas é que eram mutantes, como Vampira e Tempestade.  
    Mas dentre essas incríveis mulheres do mundo virtual, uma das mais insignes entre jogadores e jogadoras, não é apenas membro de uma equipe, uma opção selecionável, mas sim, protagonista do próprio jogo. Lara Croft aparece em Tomb Raider como uma arqueóloga esperta, ágil, boa atiradora e sexy. Claro que o design de seu corpo foi pensado para conquistar o público, desde os garotos, que a desejam, até as garotas, que (a desejam também, por que não?) sonham ser como ela. 
    Mas as meninas não querem ser Lara Croft só porque ela tem formas perfeitas, mas sim porque ela corre, pula, atira, luta, resolve enigmas e atravessa abismos com a graça e desenvoltura que nos é peculiar. Primeiramente, Lara é um ícone a romper com certo tipo de criação das personagens femininas: frágeis, com poucas habilidades físicas e que sempre precisavam de um herói para salvá-las. Além dessa ruptura, Lara foi elaborada para capturar públicos formados por homens e mulheres. 
    A criação de personagens centrais femininas vem contribuindo para a transformação de uma certa lógica masculina e machista por parte dos elaboradores dos jogos. O deslocamento da centralidade de personagens masculinas para, em alguns casos, personagens femininas, expressa uma mudança. Um exemplo disso ocorre na Core Design (responsável por desenvolver graficamente a série Tomb Raider), que abriu vagas para a contratação de mulheres. A idéia é aumentar a equipe de testers (avaliadores de games) com profissionais do sexo feminino para diversificar a visão lógica sobre as estratégias do jogo. 
    Observamos que as personagens femininas são constituídas em respostas a limitações culturalmente estabelecidas em torno de personagens masculinas. As estratégias para a montagem das personagens femininas articulam marcas de gênero atribuídas aos homens (força, agilidade, velocidade) com aquelas atribuídas às mulheres (intuição, beleza e graça). Um dos enfoques relacionados à atualização está aí: as personagens femininas são fabricadas com base em marcas híbridas (femininas e masculinas) e as masculinas continuam sendo montadas sob apenas marcas masculinizantes e binárias. Essa é a base do sucesso de Tomb Raider com um público tão amplo: perfeita em suas habilidades cognitivas, intelectuais, físicas e corporais, Lara Croft é construída como “a mulher”. Melhor que Lara, só outra dela:



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