segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Liberté, égalité et fraternité. Ou não?

Na manhã de hoje, estampando a capa de alguns dos jornais de maior circulação do país estão notícias sobre as manifestações que aconteceram esse domingo a respeito do casamento e da adoção de crianças por casais homossexuais. Chama a atenção na capa da "Folha de São Paulo" a imagem da multidão que se reunia embaixo da Torre Eiffel para se posicionar contra o projeto de lei do presidente François Hollande para legalizar não só o casamento civil de casais homossexuais, como ainda permitir que esses mesmos casais possam ter acesso à adoção, projeto que deve ser votado no fim desse mês. Segundo o governo, a multidão somava 340 mil pessoas, mas os organizadores do protesto afirmam que o número chegou a 1 milhão. Embora volumosa, a multidão não expressa a opinião da maioria da população francesa, da qual 56% apoia a união de casais homossexuais e 50% a adoção. No mesmo dia, quatro ativistas do grupo Femen tiraram suas roupas durante a missa dominical do Papa no Vaticano para protestar contra o posicionamento do líder da Igreja Católica contra o casamento homossexual, imagem que estampa a capa do jornal "Correio Brasiliense".

Esse impasse representa a resistência de alguns grupos da população em aceitar que alguns direitos civis sejam estendidos à totalidade da população. Quão irônico assistir tal cena no lar da mais famosa revolução de nossa era. É impossível pensar em França e não pensar no estandarte da Revolução Francesa. E é sob esse mesmo estandarte, sob o vermelho, azul e branco da bandeira francesa que os manifestantes contra a união homossexual lançam seu apelo, tão pouco condizente com seu significado original de liberdade, igualdade e fraternidade. Porque esses três princípios fundadores da França moderna, e de toda a sociedade ocidental, parecem tão ofensivos a uma parcela conservadora tão grande da população?

Todo o pensamento ocidental moderno se baseou nesses três princípios básicos da dignidade humana, mas sua plenitude tem dificuldade de ser reconhecida ainda hoje. Assim entendemos o protesto na França, assim entendemos o duro posicionamento de alguns estratos políticos brasileiros, que marcam sua posição no Congresso Nacional. Negar o reconhecimento do direito de casais homoafetivos a constituir uma família, sobre as bases legais do Estado é negar a cidadania plena a uma parcela da população historicamente já tão privada de sua liberdade. A luta pela reversão dessa situação não corre apenas nas esferas legais (longe disso), mas em toda a sociedade. Mas é por meio de leis que tais conquistas podem ser concretizadas, e é por meio da afirmação de direitos básicos através da letra escrita da legislação que se pode esperar uma mudança de postura, ao acabar com a institucionalização do preconceito.

Está marcada para o dia 27 de janeiro uma manifestação em Paris para apoiar o projeto do presidente. Enquanto isso, o governo afirma que manterá sua posição, e não fará um referendo para decidir a questão. Afinal, democracia não é o único princípio que rege nossa sociedade, e nunca deve ser usada como desculpa para permitir que uma maioria prive de sua cidadania algum grupo.
Estamos aqui torcendo para que, uma vez mais, liberté, égalité e fraternité não sejam só mais um discurso comovente.


Obs.: Dá pra ler a matéria da Folha de São Paulo nesse link http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/88539-marcha-contra-casamento-gay-toma-paris.shtml

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