“Escribe con honestidad y no te preocupes de los sentimientos ajenos, porque diga lo que digas, de todos modos te van a odiar.”
O conselho é dado por Nívea Del Valle, personagem da escritora Isabel Allende, no livro Retrato en sepia (2000). Mas quem conhece a obra da chilena, sente como se a própria autora o dissesse. Suas histórias, cujos personagens até se embaraçam entre um romance e outro, nasceram no contexto de uma sociedade patriarcal e reprimida pela ditadura. Ainda assim, ela criou uma receita suculenta para narrativas de família, paixão, guerrilha, conquista, culinária, política, sociedade, e um jeito tão especial de apresentar a cultura chilena, que as páginas praticamente exalam cheiros latinos.
Mas mais do que isso, ela escreveu sobre mulheres, todas elas. É incrível, mas muitas vezes sutil em sua obra, como as mulheres aparecem como pilar de sua comunidade, seja ela a casa, a cozinha, a arte, a guerra, ou a cama de seus amantes. Tem aquela que vai a um continente desconhecido e constrói um país, a matriarca clarividente, a escritora guerrilheira, a pacata senhora que escreve os mais famosos contos eróticos ou a jovem tão ingênua quanto sedutora. O que há em comum entre todas elas não é nada mais que amor. Amor a seu filho, à sua terra, à sua casa, ao seu corpo, ao seu trabalho, ao seu homem, à sua liberdade... porque com o perdão da pieguice, literatura é basicamente paixão. O resto é vírgula.
Do trecho citado surge a vontade de dizer até mesmo aquilo que incomode a todos, sendo chata, desde que seja dito com sentimento. E é com essa bravura guardada entre os seios que a mulher de Allende pisa qualquer chão com firmeza, num caminhar balançante, como se levasse consigo uma música secreta, conquistando o leitor com perspicácia e ousadia, até chegar onde ela quiser.
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