sexta-feira, 16 de março de 2012

A terceira margem do rio



Estava eu procurando um tema interessante para o texto de hoje, algo que as pessoas lessem e pensassem “nossa,que legal!” ou xingassem algo bem elogioso. Eu queria falar para os rapazes e moças, para as pessoas que pensam diferente de mim. Porque uma boa discussão não é feita de concordâncias. Mas vieram tópicos já clichês que não parecem muito com o que falo normalmente.

Então, numa dessas horas pelo facebook (um belo consumidor de tempo), esbarrei na tirinha acima. Eu poderia começar uma fala de que é machista e desrespeitoso, reprodutor de um discurso discriminatório e blá blá blá (perdoe quem considerar a tirinha tudo isso); e de fato, é possível ofender-se com ela, se você levar tudo ao pé da letra, a ferro e fogo.

A questão é que o humor está justamente nos trocadilhos, em falar coisas que as pessoas entendem sem precisar perguntar. Nos meus tempos de escola não havia atividade mais irritante do que as interpretações de quadrinhos, “onde está o humor da charge?”,eu deixava sempre em branco. E convenhamos, quem nunca riu de uma piada de loira, português e etc? As piadas geralmente recorrem a estereótipos, a figuras de fácil acesso, é uma realidade caricaturada, mas conhecida. O que me chocou foram os comentários. Pessoas revoltadas postando textos imensos sobre como essa tirinha nos ofende. Pessoas rindo num parágrafo inteiro de “kkkks”. Pessoas dizendo que as mulheres são assim mesmo, só muda a cor do cabelo e o endereço.

Comecei a refletir sobre essa “guerra virtual”, as trocas de argumentos que muitas vezes não levam a conclusão nenhuma e do meio por fim vai pra baixaria. Há quem leve tudo tão a sério que tomam uma piada, um comentário ou uma risada, como ofensa. E mesmo que exista um backgroung discriminatório e machista, não é atacando até um espirro que se ganha a briga, se é que é mesmo uma briga.

E pode parecer contraditório e até incoerente, já que os cientistas sociais são conhecidos pela desconfiança, “o pedaço de um retrato nunca é ele inteiro”, nós estudamos para descortinar a realidade, quebrar toda e qualquer primeira impressão e conhecer as coisas de forma tátil. Mas tem que haver separação, pelo bem de nossa sanidade. Viver 24horas por dia apontando o domínio capitalista, a alienação midiática, o machismo e a homofobia maquiados, enlouqueceria qualquer um.

Para mim a grande questão sempre foi realizar uma triagem, saber o que estamos comendo e o porquê, essa antropofagia desenfreada que vemos hoje pode dar uma bela dor de barriga.Reproduz-se tudo, idéias, discursos, escolhas, sem dar ao objeto de distribuição um pedaço de si. A criticidade precisa ser exercitada, sem dúvidas, mas também é preciso comer besteira de vez em quando.

Aprendi com um grande amigo que escolher o caminho do meio não é ser covarde, pelo contrário, é uma santa dúvida que pode salvar sua pele. E me guio assim, rindo dos estereótipos femininos que nos colocam como matracas quebradas, um radinho de vitrola que só repete e ao mesmo tempo, vendo como isso é interessante para o mundo androcêntrico no qual vivo.Se nós falamos tanto, de uma maneira que ninguém consegue entender, pra que vão nos ouvir, não é mesmo? Fico com o meio termo, não por indecisão, mas pelo direito de querer ser duas coisas que talvez não conversam muito.

O ser humano me parece sempre essa criatura ambígua e cheia de arestas, imensa dentro de si, mas minúscula diante do infinito. Não dá pra entender por completo.


Ps: tenho um link pra indicar:
O texto "O que é um homem? O que é uma mulher?" do blog Papo de Homem; fala sobre a divisão de sexo, gênero, orientação, escolha, energia, enfim, sobre essa mania de colocar as pessoas em caixinhas. Achei bem completo e faz um resgate histórico interessante.
E estou aceitando sugestões de temas, ok? Volto daqui a duas semanas!

2 comentários:

  1. Tenho que discordar (oba! agora pode dar uma discussão boa, não? hahaha). Tem muitas piadas que usam esteriótipos preconceituosos (quase redundância), mas discordo que a esteriotipificação esteja sempre exercendo o papel humorístico.

    Um exemplo? Vamos pensar nas piadas de loiras e de portugueses, que o próprio artigo cita. O efeito humorístico está na cor do cabelo e na nacionalidade dos personagens, ou está no erro de compreensão do personagem, expresso por sua ação ou discurso? Para mim parece claro que é a segunda opção, tanto é que quase todas as piadas de portugueses e loiras poderiam ter seus protagonistas intercambiados sem nenhuma perda no humor. Se ainda está em dúvida, pode experimentar trocar os protagonistas por pessoas quaisquer (como pelo 'Joaoziho', por exemplo), que verá que o efeito será o mesmo.

    É lógico, existem piadas em que o esteriótipo É o efeito de humor, como no caso da tirinha ali em cima. E essas são as piadas preconceituosas. Não há diferença alguma na construção do humor dessa tirinha para uma piada racista qualquer ou para as piadas sobre judeus ou sobre estupros. Porém, existe sim uma GRANDE diferença entre essas piadas e as piadas do tipo discutido acima. O que acontece é que os defensores das piadas preconceituosas tendem a esconder essas diferenças, para poderem defender uma 'licensa moral humorística', baseando-se no falso argumento de que não existe humor sem preconceito.

    Engraçado pensar que as pessoas que usam o argumento de que 'o mundo seria infeliz se as piadas preconceituosas deixassem de existir' nunca param para pensar que essas piadas preconceituosas podem fazer alguns rirem, mas fazem outros tantos se sentirem ofendidos. Me desculpe, mas isso não me parece um mundo muito 'feliz'.

    Só para terminar meu comentário imenso, acredito que tanto faz a pessoa tomar o caminho de um lado, do outro ou do meio, desde que ela SEMPRE faça essa escolha de acordo com cada situação e não invente uma regra soberana para ser aplicada cegamente em qualquer situação.

    Abraços!
    PS: Cliquei nesse post por causa do título. Que engraçado, esperava algo completamente diferente hehe
    PS2: Esse assunto é tão bom que acho que vou publicar um texto sobre no meu blog. Sinta-se à vontade para confrontá-lo!

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  2. Olá!
    O título se refere ao tema central do texto, que não se foca exatamente nas piadas, isso é o plano de fundo. O que eu quero ressaltar é o direito e dever de tentar ver de outra maneira, não tão ferrenha. O que sempre me incomoda muito nos discursos é o radicalismo, peguei como exemplo o da piada, que não me incomoda, de fato, mas que com certeza incomoda alguém.
    Muito bom seu comentário! Obrigada pelo feedback! Volte sempre!

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