domingo, 11 de novembro de 2012

E agora, para onde vamos?

Imagine você um grupo de mulheres a caminho - não, não sabemos para onde exatamente - todas num luto que mais parece tango, em movimentos sinistros e pés acariciando a poeira. Eis o começo de "E agora,  para onde vamos?", filme dirigido pela talentosa Nadine Labaki.

Mais que uma história sendo contada o filme é um pedido de paz. Num pequeno vilarejo libanês convivem muçulmanos e cristãos, cercados por minas de guerras anteriores, longe da "civilização" eles conseguem partilhar da mesma comunidade sem muitos problemas. Os homens se reúnem no bar local para beber, as mulheres fazem juntas os pedidos de compras (que são feitas por dois garotos na cidade) e as crianças correm soltas nas vielas, sem dar muita importância se são de Jesus ou de Maomé. 

Porém, há rumores de mais uma guerra civil no Líbano, nós contra eles, e o vilarejo, local da sagrada comunhão, torna-se cada vez mais dividido. Os homens, aqui apresentados de certa forma como incontroláveis, compram uma briga que não é sua e finda-se a paz. As mulheres, então, cansadas de perder maridos, filhos, irmãos e sobrinhos, compram uma briga que também não lhes pertence, mas que lhes fora jogada nos braços. Pois bem, resolvem elas e os representantes religiosos findar com a guerra.

Há uma beleza na simplicidade que poucas 
vezes é traduzida, mas Labaki soube cantar esta fábula atemporal justamente assim, de forma simples e bela. Há os momentos impagáveis que nos fazem rir, como quando as mulheres do vilarejo cozinham bolinhos com haxixe para drogar os senhores e assim, esconder suas armas; mas há também as tristezas mais profundas da perda, como a mãe que guarda para si a morte acidental do filho, para que não seja o estopim da inevitável guerra. 
A seguir, o trailer:




A questão é muito simples, para evitar a guerra, elas estão dispostas a qualquer coisa, contratam até dançarinas russas para "distrair" os homens da cidadela, passando por cima de qualquer receio moral ou religioso. Para essas mulheres pouco importa se a guerra é um "mal necessário", porque até agora, a elas só ficaram as perdas e faltas. As cenas mais engraçadas são justamente as desse estranhamento das senhoras muito recatadas e "protegidas" por vestidos e véus com as dançarinas muito loiras e bronzeadas e de pouca roupa. 


Para uma mente como a minha, solo fértil para a literatura fantástica, alimentada por Macondos, Titas e Florentinos, e que não teme volver, "E agora, para onde vamos?" é natural e quase de casa, os dramas que envolvem morte e medo, amor e sacrifício fazem parte da maneira como leio o mundo, não só os livros e filmes. Indico com carinho os cem minutos dessa história que soa como uma canção de mãe, extremamente cálida e capaz de uma saudade excruciante.

O título do filme só se compreende ao final, a chave está na morte, o desfecho é a pergunta. E numa breve análise concluo, para manter a vida, cruzamos limites. A nós mulheres sempre foi delegada a função de amar infinitamente como mães, filhas e esposas, eis a maior liberdade e prisão. Hoje talvez possamos escolher quem amar e como amar, mas ainda tenho dúvida do que é "natural" e do que é construção social. No fim me parece que somos mesmo produto e reprodutores de nosso tempo, todos muito preocupados em apenas viver.

Aqui uma resenha breve sobre o filme, aqui o download.

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