Em
24 de Fevereiro de 1932 o decreto 21.076 do Código Eleitoral Provisório foi
aprovado, assegurando o voto feminino, com algumas restrições (apenas casadas
ou viúvas e solteiras que tivessem renda própria), mas fruto de uma luta
iniciada ainda no Império. Em 1934 tornou-se facultativo para todas as mulheres
e em 46 a obrigatoriedade do voto foi estendida. Contamos em 2013 então 81 anos
dessa conquista.
Ainda no Império, com o movimento abolicionista e toda a
efervescência política, questionava-se o sufrágio feminino. Com a Proclamação
da República e a nova Constituição o debate cresceu, e por fim, não se aprovou,
mas também não se proibiu, abrindo brechas para diferentes interpretações. De
1919 a 1928 tramitou o Projeto de Lei do senador paraense Justo Chermont,
que propunha o voto para mulheres maiores de 21 anos. Em 1927 Celina Guimarães
Viana se tornou a primeira eleitora do Brasil, em Mossoró, no RN. Em 29, Alzira
Soriano de Souza foi eleita a primeira prefeita, em Lages, também no RN, devido
as brechas da Constituição Republicana de 1891.
Em 1919 Bertha Lutz voltou ao Brasil recém-graduada da
Universidade Sorbonne, e fundou a Liga para a Emancipação Intelectual da
Mulher. O movimento tomou força e em 22, com a participação de Bertha na 1°
Conferência Pan-Americana de Mulheres, tornou-se Federação Brasileira pelo
Progresso Feminino, FBPF. A principal reivindicação era o sufrágio feminino, para
que a partir daí as mulheres adentrassem espaços tradicionalmente masculinos e
pudessem alçar voos mais altos. Como a própria Bertha colocava que "o
sufrágio feminino não é um fim em si mesmo, mas sim um instrumento a ser usado
para melhorar a condição das mulheres".
Em 1932, o sufrágio foi estendido às
mulheres no Código Eleitoral Provisório. E Bertha e Nathércia Silveira
foram as representantes na Comissão de Elaboração do Ante-Projeto à
Constituição de 1934, a FBPF esteve presente em todo o processo, para garantir
que não houvesse retrocesso. Em 1936 Bertha, que era suplente, assumiu o cargo
de deputada federal.
Muitas são as críticas quanto ao comportamento das feministas do
começo do século passado, que ao reivindicar apenas o voto e aliar-se a grupos
que historicamente as oprimiam, portar-se de maneira moderada e tendo ações que
beneficiavam em primeira instância apenas mulheres já
privilegiadas, contribuíram para a manutenção do status quo,
legitimando uma nova ordem burguesa.
Entretanto, tais argumentos apresentam um anacronismo estupendo. Como coloca Rachel Sohiet "a
utilização deste recurso revela uma das táticas próprias a sujeitos submetidos
a relações desiguais de poder. As feministas com Bertha Lutz à frente,
valeram-se de uma tática que mobilizou para os seus próprios fins uma
representação imposta - aceita, mas desviada contra a ordem que a produziu".
Elas não estavam mantendo o statos quo, estavam modificando-o, com
os instrumentos que possuíam e da maneira mais inteligente possível. Isso é
admirável.
Revoluções, subversões totais da ordem, historicamente não terminam
bem. Acredito ser um método mais inteligente utilizar-se de reformas. As duas forças que movem o
desenvolvimento humano são as de conservação e modificação, apenas o equilíbrio
entre as duas possibilita estabilidade e progresso simultaneamente. Por
isso reconheço que sem Bertha, Nathércia e todas as mulheres da FBPF e das que
apenas apoiavam o movimento na surdina, hoje eu sequer cogitaria falar sobre
política. Foram elas que deram os primeiros passos para que pudéssemos
reivindicar outras tantas coisas ao longo desse século. Foram elas, dentro de suas
possibilidades, que abriram caminho lentamente para que hoje pudéssemos correr
nessa estrada.
O voto, na democracia moderna, é o instrumento pelo qual os
cidadãos delegam poder de decisão e representatividade aos seus líderes. É
nossa moeda de troca (e não tô falando de compra de votos, por favor, né), por
ele temos como pressionar os políticos para que nossas pautas sejam ouvidas e
reivindicadas. Sem o voto feminino questões relativas às mulheres nunca teriam
chegado ao centro das discussões e se tornado importantes no desenvolvimento do
país. Sem o voto as mulheres nunca teriam adentrado esse espaço
tradicionalmente masculino, desbravando preconceitos e quebrando tabus. Sem
ele, ainda estaríamos sob tutela de nossos pais, irmãos e maridos. Por isso, um muito obrigada a essas mulheres que há mais de 81
anos atrás lutaram por um direito tão básico ao cidadão moderno. Um muito obrigada.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SOIHET, Rachel. Bertha Lutz e a Ascensão Social da Mulher. Niterói: Mestrado em História. Departamento de História. ICHF, UFF
Aiai Nands... Nossas divergências políticas...
ResponderExcluir"Revoluções, subversões totais da ordem, historicamente não terminam bem."
O que é "não terminar bem"?
A Revolução Francesa terminou mal para a burguesia francesa? A Revolução Industrial terminou mal para o Capitalismo? Ou vivemos em um mundo capitalista através de reformas progressivas e lentas, em que a surgida burguesia foi comprando títulos nobres e, um dia, tornou-se absoluta sobre a nobreza de sangue e aboliu a nobreza e todo mundo concordou e achou ótimo?
Não terminam bem porque no fim das contas sempre uma ordem volta a vigorar e aqueles que mais precisam da mudança geralmente só passam a servir a outro senhor. Como eu disse, acho mais inteligente reformas graduais e que sejam efetivas.
ExcluirA revolução industrial pode se dizer que foi gradativa, a francesa teve seus momentos de caos e depois veio o Napoleão reinstaurar a ordem e legitimar novos privilegiados.
A estabilidade política permite ações a longo prazo e até a curto prazo que sejam mais confiáveis, e com uma "revolução" a estabilidade é zero.
Eu fico com o meio termo entre manter e mudar, a terceira margem do rio me parece a mais segura.
E esse trecho foi super cortado, hahah tentei não provocar, era bem maior e ia dar pano pra você criticar horrores. Mas eu já tenho levado porrada demais, então tentei só defender as sufragistas e ponto.
ExcluirEu gostei MUITO do seu texto. Como texto e como informação. Acho que a luta contra-hegemônica é essencial, mas deve ser APENAS um meio e nunca um fim.
ExcluirMinha crítica ao trechinho foi apenas porque achei que era contraditório com as suas próprias posições políticas. O próprio capitalismo foi instituído na base de muita revolta e porrada, não reforma. (As reformas costumam ser consequência de revoltas e porradas. Assim como muitas sufragettes tiveram de se suicidar publicamente para que o movimento ganhasse qualquer expressividade na mídia do século XIX)
Mas eu não sou o capitalismo.
ExcluirO fato de eu me alinhar a muitas ideias liberais não me encarcera nisso. Cada questão traz uma reflexão diferente, influenciada por n fatores e meu posicionamento pode não ser "coerente" com os outros.
Se o capitalismo até agora foi instituído com base na revolta, eu acredito que para mantê-lo o melhor são as reformas, é um bicho que se refaz, ele engole as críticas e se reconstrói, nem sempre dá certo, mas é o sistema das idas e vindas, crises e altas.